PRETO
E BRANCO
-A
dialética como dinâmica da evolução do espírito humano-
Medimos uma obra de arte por seu valor estético. Num romance, por
exemplo, não basta uma boa história ou um bom enredo, a forma como
isto é escrito é determinante também para definir sua qualidade.
Neste romance, ou melhor, nesta novela, os personagens não são
descritos (podem ser qualquer um). Eles não têm idades, faces e
nomes. Também a época e lugar que envolve os personagens não são
definidos (pode ser em qualquer lugar ou em qualquer época). Há um
caráter universal nos personagens que não são vestidos e
caracterizados, exceto por suas idéias.
Nesta novela não existe uma história propriamente dita. Ela não
gira em torno de um acontecimento ou de um fato que transcorra entre
a opção do certo ou errado. E, é justamente esta condição
insólita que a torna surpreendentemente contundente quando nos faz
mergulhar no universo abstrato dos personagens. Temos a oportunidade
de assistir imparcialmente o desenvolvimento do pensamento do
personagem central narrador, contudo, parece que ele vai-nos
alfinetado nos transcorrer da narração e provocando uma empatia
inquietante de suas idéias.
A personagem central diz não jogar e joga o tempo todo, inclusive
com o leitor.
Embora, não seja inusitado o uso de certas colagens em literatura, o
autor em alguns trechos da novela ousa inserir artigos, poemas e
asserções místico-filosóficas e em alguns momentos o leitor fica
na dúvida se está lendo um romance ou teorias artísticas,
teológicas, místicas e filosóficas. Mas, isto só está nesta
novela como está na vida. A narrativa não fica presa a estas
inserções. Elas apenas fazem parte de trechos e não determinam ou
mudam o curso do enredo, na verdade elas são provocações que vão
se encaixando e provocando o leitor. Somos movidos pelo pensamento da
personagem central e este se move pelas perguntas que vão surgindo.
Na verdade, há apenas uma pergunta central: o que é a vida?
A personagem parece fugir desta resposta, mas ela ousa responder. Ou
melhor, ela acha que o movimento da vida já impõe esta resposta e
ela propõe o viver como forma de se chegar à resposta.
A personagem central aponta a transcendência com via de apreensão
da vida e uma destas vias transcendentes é a poesia. Para tanto, é
necessário se entregar ao viver, ou seja, é preciso viver
plenamente para sentir a vida. Esta é a proposta e resposta do
personagem central à pergunta do seu interlocutor.
Nem tudo que você pensa é verdadeiro, mas tudo que você sente o é.
O personagem central propõe o sentir como ferramenta para alcançar
a resposta do que seja a vida. E, esta resposta é intraduzível.
Para entender a vida só se pode vive-la, senti-la. Não há uma
resposta direta como numa pergunta: onde está a porta? A resposta é
pessoal e intransferível. Só há uma forma de alcança-la:
vivendo-a.
As perguntas são usadas aqui como a dinâmica do personagem central
e, sem se dá conta, ele é movido por elas. As perguntas obrigam o
personagem a pensar por si mesmo e isto provoca as transformações e
aberturas no posicionamento deste no tabuleiro da vida, ou melhor, a
vida não é só contemplação, mas ação e, esta ação no
pensamento, é produzida pelo questionamento, pela reflexão.
Há um contraponto entre os personagens e o jogo dialético entre
ambos deixa-nos vislumbrar alguma fresta de luz, como duas pedras se
atritando e provocando faíscas.
O fato é que o “Fazedor de Perguntas”, a personagem que
interpela o personagem narrador, move este com suas inquietações e
faz das indagações a dinâmica da própria evolução do personagem
central, colocando-o num impasse consigo mesmo.
Aquele que senta à nossa frente é nosso espelho. O oposto igual a
nós mesmos. Representa as nossas contradições e foco diverso do
olhar.
Esta novela nos conduz pelo universo existencial e provoca em nós
uma abertura. Assistimos o desenrolar do pensamento do personagem
central e somos envolvidos por ele. Não saímos desta leitura da
mesma forma que nela entramos. E, este é o mérito e importância da
leitura deste romance que tem o pensamento como personagem central.
Mas, este é um livro que precisa ser interpretado através dos
símbolos.
Á princípio esta novela parece descambar para a futilidade erótica.
Ledo engano. Lembrança recorrente da genitália feminina é usada
como símbolo da fertilidade, delicadeza e vida em oposição à fria
e inerte teorização.
De fato, além da aparência, este é um romance esotérico e
precisamos alcançar aquilo que não é dito, mas sugerido para
entendê-lo em sua plenitude. Quando o personagem central olha e
aponta para a rua está apontando muito mais do que é visto
objetivamente e é isto que outro personagem não entende nem
alcança. É desta forma, que também precisamos ir além dos limites
das palavras impressas nesta novela.
O conflito entre o teórico e o prático é simbolizado pelas
personagens que, de fato, representam apenas uma única pessoa. Razão
x emoção, o material x o abstrato, etc., vão conduzindo o jogo. É
a luta entre o Eu Exterior e o Eu Interior. Enfim, o romance vai
conduzindo o leitor por meandros perturbadores e instigantes da vida
e do viver.
Tudo aqui é alegórico. Tudo aqui é simbólico. Por exemplo, uma
personagem representa a razão e a outra, a emoção. Ambas têm suas
limitações. Ambas estão confinadas num universo limitado e precisa
da complementariedade da outra. Só a liberdade pode fazer a alma
resplandecer em toda a sua plenitude na vida. Este é o jogo e ambas
só podem sair vitoriosas, de fato, quando a alma florescer e, para
tanto, ambas precisam se libertar.
O ego está no centro desta luta e tenta se impor à alma, mas no fim
o jogador consegue abandonar o próprio jogo estabelecido pelo ego e,
não jogando o seu jogo, vence a partida.
No final, podemos imaginar que na verdade só existe um personagem e
que o livro retrata a batalha que ele trava consigo mesmo. É a luta
da alma para superar o ego.
Enfim, o leitor é também despertado para esta luta e percebe e
percebe-se num jogo que precisa ganhar: vencer a si mesmo.
Por último, o autor nos coloca em xeque. Deixa-nos uma grande
reflexão ou nos coloca numa.
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